O Provocador
"A definitiva abolição da escravatura está prestes a ser assinada. Enfim, o Brasil vai libertar as últimas mucamas. O cativeiro social em que vivem as empregadas domésticas deste país vai ser explodido. Madames, tremei!
O governo vai enviar ao Congresso um projeto de lei [veja aqui] que retira as "mensalistas" do porão da informalidade e as equipara a trabalhadores normais (sinal que nunca foram, não é mesmo?). Passariam a ter direito, vejam só, ao FGTS, seguro-desemprego e horas extras.
Se quisermos de fato entrar para o mundo capitalista civilizado, um bom treino é limpar a própria privada. Isso vai soar uma brutalidade para as senhoras de classe média que nunca ensinaram seus filhos a lavar os pratos em que comem. Paciência. O mundo é cruel.
Não tanto como a relação de sinhá moça que alguns adolescentes bem nascidos e seus pais mal-educados estabelecem com a criadagem. Sim, as empregadinhas, jardineiros, cozinheiras, babás e faxineiras que se entopem nos ônibus e trens, vindas das mais longínquas senzalas.
Em nossa cultura cínica e cordial, é lugar comum dizer que as empregadas domésticas fazem parte da família. Sempre vomito quando ouço isso. E lembro de uma vizinha que guardava um prato, uma caneca, um garfo e uma faca debaixo da pia. Juro. Eram para a "moça da faxina".
Também me lembro de uma jovem da elite nordestina que, uns cinco anos atrás, pagava R$ 25 por dia para a faxineira, sergipana como ela, que limpava seu “duplex” em um bairro nobre de São Paulo. Perguntada sobre por que não pagar mais, ela disse, sem nem perceber o quanto estava sendo malévola: “Ela se vira muito bem com isso”.
O crescimento econômico, aliado à escolarização dos mais pobres, vai tornar cada vez mais rara essa figura que nunca sai nas fotos de família. Assim como nos países desenvolvidos, ter uma doméstica em casa vai passar a custar muito, muito caro.
Como disse o ex-deputado Delfim Neto, com aquela elegância tão discreta quanto sua silhueta: “Há uma ascensão social incrível. A empregada doméstica, infelizmente, não existe mais. Quem teve este animal, teve. Quem não teve, nunca mais vai ter.”
Não tenho palavras para comentar uma frase dessas. Mas saber que ela é o retrato de um pensamento prestes a ser extirpado me dá um prazer indescritível. Prazer animal."
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