XaD CAMOMILA

29 de março de 2009

A LEI É FILHA DA HISTÓRIA: Idéias sobre a função social da terra

por Gerivaldo Alves Neiva (Juiz de Direito em Conceição do Coité, Bahia)

"Sei que causa um choque danado nas pessoas essa história de que a função social da terra é essencial ao próprio conceito de propriedade da terra. Isto significa dizer que não existe propriedade rural a ser protegida, ou mesmo desapropriada, sem o cumprimento de uma função social. Para a mentalidade proprietária burguesa, realmente é um choque:

- Como não ser mais o proprietário e ter meu direito protegido se minha escritura está registrada em cartório? Como não posso expulsar invasores se minha terra é cercada há mais de 20 anos?

Sim, é verdade! Escrituras antigas e amareladas e cercas cercando o nada não bastam mais para garantir a propriedade de imensidões de terra sem cultivo algum. A pós-modernidade exige muito mais do que isso, pois é na terra que são produzidos alimentos para o mundo e é na terra que estão os recursos naturais essenciais à própria sobrevivência da raça humana sobre o planeta. Ao contrário do que pensam os proprietários que ainda guardam escrituras furadas de traças em caixas de sapatos e que apenas renovam suas cercas de ano em ano, a terra não é do homem, mas é o homem que pertence à terra e é quem tem a obrigação de cuidar dela.

Choque maior ainda causa a defesa da idéia de que a ocupação de terras improdutivas - ou mesmo que estejam produzindo em desconformidade com os preceitos constitucionais exigidos para reconhecimento do cumprimento da função social – é ação legítima em busca da concretização do projeto humano sobre o planeta e do projeto constitucional de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, fundamentada na cidadania e dignidade da pessoa humana.

Estes choques são resultados da idéia que todos nós temos de que sempre foi assim e que se a lei diz que é verdade, tem que ser verdade. O que pensamos, embora nem sempre saibamos disso, é o que nos ensinou a família, a escola, a igreja, os meios de comunicação e as leis. Então, pensando que temos um pensamento próprio, construímos ‘pré-conceitos’ sobre quase tudo e passamos a defendê-los como verdades definitivas e convenientes. Nem sempre percebemos que ao invés de personagens reais, não passamos de marionetes manipulados pelos Jornais Nacionais da vida. Aliás, que seria de nós ocidentais católicos sem as novelas da tarde, das seis, das sete e das oito? Sem os comerciais da TV? Sem o big brother? Sem futebol aos domingos e sem salão de beleza aos sábados? O problema é que enquanto estávamos cantarolando que queríamos ser uma “metamorfose ambulante”, como pregava o rebelde Raul Seixas, o sistema nos transformava, a todo o momento, em uma “mentalidade imutável”. "
  • Para ler o texto na íntegra, clique aqui.

NOTA: Gostei muito desse artigo! Pensar a "função social da terra como inerente ao conceito de propriedade" é uma grande novidade para mim e, quando li o post "Aproveitando a viagem", no último domingo, fiquei com essa idéia - mal resolvida - na cabeça. Agora, finalmente, entendi. Gracias!

Ainda sobre o assunto, confira também o post "Não estou só".

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