CONCLUSÃOEm 7 de janeiro de 2011, faço estes autos conclusão ao MM. Juiz da vara em epígrafe. O(a) esc.
Vistos.
Trata-se de ação civil pública, intentada pelo Município de Campinas, visando à desocupação de área de preservação permanente (havendo aproximadamente 20 (vinte) construções irregulares).
Às fls. 277 verso, o Ministério Público concordou com o pedido liminar.
A antecipação de tutela foi deferia às fls. 279/281, determinando-se que a autora indicasse para onde seriam encaminhadas as famílias, fixando-se prazo para a desocupação e a demolição das construções pelas próprias famílias, bem como se observando que, após cumprido os itens anteriores, seria expedido, se o caso, mandado judicial para a retirada dos ocupantes, autorizando-se ao autor a demolição das construções.
Às fls. 293/295, o autor informou as providências já adotadas e que está providenciando um “plano de remoção”.
O Ministério Público, por sua vez, às fls. 327/328, requereu a reconsideração da liminar, para que a desocupação fosse cumprida imediatamente, com a posterior demolição das construções pelo autor, sendo que “tal medida se faz necessária porque permitir que os próprios ocupantes dos imóveis retornem ao local para retirar os materiais reaproveitáveis facilitará a reocupação dos imóveis, tornando impraticável o cumprimento da decisão judicial, uma vez que as famílias não assistiriam passivamente a demolição de suas casas” (fls. 328).
Pleiteou, ainda, urgência no cumprimento da medida, uma vez que “quase um ano se passou desde a propositura da ação”, destacando-se “a grande velocidade com que os assentamentos populares crescem, comprometendo a viabilidade de remoção e recuperação do dano ambiental e, ainda, as notícias veiculadas pela imprensa de inúmeras vítimas provocadas pelas enchentes dos rios e córregos que cortam nossa região, a expedição do mandado de remoção se faz urgente” (fls. 328).
Pois bem.
Assiste razão ao Parquet ao sustentar que “a grande velocidade com que os assentamentos populares crescem” compromete “a viabilidade de remoção e recuperação do dano ambiental” (fls. 328). No entanto, não menos verdadeira é a percepção de que a grande velocidade na remoção das famílias, sem as devidas cautelas, compromete também os direitos fundamentais dos réus, na medida em que seriam desalojados sem que o próprio autor tenha apresentado o referido “plano de remoção”, com alternativas de moradia para as famílias – que, de acordo com a própria inicial, não ocuparam o local poucos dias antes da propositura da demanda. Ou seja, passados (ao menos) oito meses de inércia da administração pública em impedir a ocupação irregular da área (fls. 5), não é razoável que sejam as famílias desalojadas às pressas. A par da ausência de perspectiva concreta de virem a participar de programa habitacional que lhes garanta o direito constitucional à moradia (artigos 6º e 23, IX), conforme informações do próprio autor, às fls. 299, tem-se que ainda não se apresentou o indicado “plano de remoção” (fls. 295).
É evidente que o juiz não deve permanecer alheio à realidade apenas porque esta não foi devidamente formalizada nos autos. Porém, a par do respeito às regras processuais, tal como aquela que determina a observância da causa de pedir remota (fatos que fundamentam o pedido: ocupação de área de preservação permanente, e não risco aos ocupantes, por conta de prováveis enchentes no local), não se tem qualquer informação concreta no sentido de que os réus estejam correndo risco em razão das cogitáveis enchentes.
Diante de tais considerações, sem prejuízo do aguardo de nova manifestação do autor (fls. 295), tem-se como recomendável a oitiva dos principais envolvidos nos fatos. Assim, DESIGNO audiência para o dia 25 de janeiro de 2011, às 14:00 horas.
Tendo em vista o grande número de réus, faculto – e até mesmo recomendo – a presença apenas de seus representantes (eventuais líderes comunitários ou moradores eleitos para tanto). Caso grande número se faça presente, advirto que serão ouvidos, a princípio, apenas 3 (três) réus.
Faculto às partes, ainda, a apresentação, na data da audiência, de até 3 (três) testemunhas.
Dê-se ciência ao Ministério Público.
Após, e de modo a se garantir o efetivo contraditório, determino que se abra vista dos autos à Defensoria Pública do Estado de São Paulo, que possui dentre suas atribuições, nos termos do art. 5º, III, da Lei Complementar do Estado de São Paulo nº 988/2006, “representar em juízo os necessitados, na tutela de seus interesses individuais ou coletivos, no âmbito civil ou criminal, perante os órgãos jurisdicionais do Estado e em todas as instâncias, inclusive os Tribunais Superiores” – sendo visível que aqueles que “não possuem outra alternativa de moradia” (fls. 5) são presumivelmente “necessitados” –, para que tome ciência dos fatos e, se o caso, passe a atuar no feito.
Cumpra-se a parte final de fls. 281, citando-se os réus.
Na mesma oportunidade, intimem-se os réus da audiência designada.
Int.
Campinas, 7 de janeiro de 2011.
Roberto Luiz Corcioli Filho
Juiz Substituto
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Nota da blogueira: Essa decisão foi postada ontem (22) no blog do autor - Justiça e Mais - sob o título "Lembrei-me hoje desta decisão...". Trata-se de um belo contraponto ao post da série "Justiça em Transe", que traz a nota (canhestra) da APAMAGIS e alguns comentários sobre a reintegração de posse levada a cabo, da forma mais truculenta possível, em Pinheirinho (São José dos Campos/SP). Então, resolvi publicá-la aqui no blog; porque há outras como ela e - acima de tudo - porque a gente não pode deixar de acreditar: "quem tem consciência para ter coragem/ quem tem a força de saber que existe/ e no centro da própria engrenagem/ inventa a contra-mola que resiste".
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